19 de julho de 2014

Sobre vinhos na Provence: epílogo


Chega ao final a série Sobre vinhos na Provence.

Conforme comentei no prólogo desta série, a Provence é uma das poucas regiões no mundo que são conhecidas principalmente pelos vinhos rosés. A grande maioria do que conhecemos corresponde a um estilo bem específico: de cor delicada, seco, leve e fresco, produzido a partir de um corte com algumas das seguintes variedades: Syrah, Grenache, Cinsault, Mourvèdre e, em menor escala, Carignan.

No entanto, em todo este período na região, passeando, visitando produtores, provando e bebendo vinhos, pude conhecer na prática a grande variedade de vinhos produzidos por lá: de vinhos brancos jovens a envelhecidos em madeira, passando por vinhos que amadurecem mais de um ano em tanques de inox; rosés jovens e frescos, outros com 9 anos de idade, e ainda rosés com estágio em madeira; tintos leves ou encorpados; e por fim os vinhos de sobremesa típicos, que me surpreenderam.


Os pequenos, exclusivos, e "caros"


Nesta minha viagem, eu foquei nas pequenas denominações de origem, de produção diminuta. Afinal, era a melhor chance que eu teria de conhecê-los: dificilmente eu conseguiria encontrar vinhos dessas regiões no Brasil, e se encontrasse, seriam absurdamente caros. Nestas regiões, os vinhos sempre custaram mais do que €10, em alguns casos, mais de €20.

Por outro lado, convertendo o valor para Real, valores de €10 a €15 ficam entre R$35 a R$50, ou seja, são mais baratos do que o que costumamos pagar por vinhos aqui. O problema é o nosso Custo Brasil, que fariam estes vinhos chegarem aqui custando mais do que R$150.

Mas porque são mais caros que os outros vinhos da região? Normalmente são produtores muito pequenos, com rendimentos limitados pelas regras de suas AOPs, muitos são orgânicos, ou biodinâmicos, e/ou utilizam exclusivamente colheita manual. Também, freqüentemente, são vinhos com maior estrutura, que se reflete diretamente no tempo de guarda. Mesmo entre os rosés, temos alguns que não são feitos para consumo imediato (vejam os casos do Chateau de Crémat e do Château Simone).


Segue abaixo um resumo do que eu encontrei nessas AOPs mais conceituadas:

Bellet

Os tintos e rosés são feitos com variedades exclusivas (Folle Noire e Braquet). O tinto que provei era bem elegante, e fácil de beber. Os rosés são bem diferentes um do outro, mostrando que lá também tem produtor que prefere fazer um rosé de cor mais carregada (veja a foto abaixo). Quanto aos brancos, eram fortemente amadeirados. Não chegavam a ser desequilibrados, mas não são fáceis, e não agradam à maioria das pessoas.
Leia sobre o Château de Crémat.
Leia sobre a harmonização com o vinho branco do Château de Bellet.


Cassis

É a principal denominação de vinhos brancos. Estruturados, complexos, raramente com passagem por barrica. Também não são vinhos brancos tão fáceis. Na hora, não me encantaram, mas comprei uma garrafa, para fazer uma 'contra-prova', e gostei muito do resultado.
Leia sobre minha visita ao Clos Sainte Magdeleine.
E aqui, o relato da 'contra-prova' do vinho.

Les Baux de Provence

Região de vinhos tintos, quase todos orgânicos. O Domaine des Terres Blanches é razoavelmente grande, considerando o tamanho médio das propriedades nessas regiões. Por isso, seus preços estão entre os mais em conta. O tinto e o rosé básicos são bem gostosos. Já o L'Exception é mais caro, porém vale o preço.
Leia sobre os vinhos do Domaine des Terres Blanches.

Palette

Apesar de ser a menor apelação, me parece a menos coesa.
De um lado, temos o Château Henri Bonnaud, que é especializado em tintos. Seu Quintessence Rouge é especial. Além disso, seu rosé com leve toque amadeirado ficou muito interessante.
Leia o relato de minha visita ao Domaine Henri Bonnaud.

Do outro lado fica o Château Simone, um ícone, e sua fama não é em vão. Produzem principalmente brancos, mas seu rosé é tão especial, que pode ser guardado por vários anos.
Leia sobre o vinho rosé com 9 anos de guarda.


Côtes de Provence - Sainte Victoire

Hoje é uma sub-região dentro da genérica Côtes de Provence. Mas seus vinhos têm maior reputação, e não me surpreenderia se a região virasse uma denominação independente. Além do Château Henri Bonnaud, que produz alguns rótulos com esta apelação, conheci também o Château Grand Boise. Os rosés de ambos produtores são deliciosos.
Leia sobre a visita ao Château Grand Boise.

Bandol

Coloco na lista só para constar. Os seus rosés não me agradam: são pesados, alcoólicos, e chatos. A fama da região recai sobre os tintos, mas tive uma experiência desagradável, com um vinho defeituoso. Fico devendo provar um tinto em boas condições. O melhor foi o vinho branco, que apesar de leve e fresco, é caro para um vinho de piscina.



As cooperativas: vinhos bons e baratos


O mais barato que se pode conseguir são os vinhos de cooperativa. São estes os vinhos que os locais consomem regularmente, e também os vinhos que tomamos nos restaurantes da região, quando pedimos um pichet (jarro), em vez de uma garrafa. Donos de restaurantes, e consumidores habituais, levam seus galões, para serem recarregados na torneira, a preços que às vezes ficam abaixo de €2 por litro! Os mais baratos podem ser doces, por isso é melhor se certificar. Mas aqueles denominados AOC - ou AOP - são secos, a legislação obriga.

Os vinhos mais baratos não são necessariamente ruins. Eles não terão a mesma qualidade, e provavelmente serão vinhos para se tomar logo. Os rosés, principalmente, devem ser consumidos dentro de um ano. E por que são mais baratos? Em primeiro lugar, as cooperativas servem exatamente para reduzir custos, já que os produtores não serão obrigados a manter caves individuais. Também produzirão em maior escala, com tanques maiores, utilizam colheita mecanizada, o que faz decair um pouco a qualidade das uvas, mas que pode ser corrigido com adição de substâncias corretivas. Em terceiro lugar, as cooperativas estão localizadas dentro das grandes AOPs, e isso significa que as regras de produção são menos rigorosas (permitem rendimentos maiores, utilização de variedades de uva mais produtivas, etc.).

Coteaux de Pierrevert

A AOP Coteaux de Pierrevert é rara e exótica como as cinco descritas acima, mas sem a mesma reputação. Também é relativamente grande em extensão, mas grande parte da produção é de vinhos regionais (isto é, classificados como IGP).
A Cave de Pierrevert tem vinhos rosés simples, mas agradáveis, e baratos. Têm cor um pouquinho mais escura, com tonalidade mais cereja.
Leia sobre a Cave de Pierrevert.

Lubéron

Lubéron é Provence, mas seus vinhos, não. Por quê? Não sei, só sei que é assim. De qualquer maneira, encontramos deles por toda a região, e seus rosés não são diferentes dos da Provence. Os vinhos do Domaine de Régusse têm a mesma tonalidade, e o mesmo sabor que os de Pierrevert. Só são um pouquinho mais caros (entre €6 e €7).


Côtes de Provence

A Guilde des Vignerons produz um rosé muito interessante, com uma cor muito suave, a cara da Provence. E apesar de ser dos mais caros do portfólio, custa apenas €5,50.
Leia sobre La Guilde des Vignerons.


Vinhos especiais


A Provence não é terra de espumantes e, apesar de eles existirem, nessa viagem, não tomei nenhum que valesse a pena comentar. Por outro lado, quando de trata de vinho de sobremesa, eles têm um produto genuinamente típico, extremamente tradicional, mesmo que tenha sido esquecido pelas legislações francesa e européia. O vin cuit é muito saboroso, e com um equilíbrio muito interessante entre açúcar e acidez.
Leia sobre minha experiência com o vin cuit.



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