Do Sudoeste da França

Dentre as regiões vinícolas da França, o Sud-ouest é uma das mais extensas, mas pouco ouvimos ou lemos a seu respeito. Certamente não é por falta de tradição ou qualidade em seus vinhos, e sim por motivos histórico/comerciais. O Sud-Ouest engloba 13 departamentos que se localizam entre Bordeaux e o Languedoc-Roussillon. É uma região extensa e relativamente pouco coesa, contendo em si algumas regiões de facto, além de diversas denominações de origem bastante distintas.

A região é delimitada pelas encostas do Maciço Central a leste, pelos vinhedos do Languedoc a sudeste, pelos Pireneus ao sul, pelo Atlântico a oeste e por Bordeaux a noroeste. O clima é influenciado principalmente pelo Atlântico, sobretudo no oeste, mais próximo à costa. Os ventos do Atlântico garantem umidade e pluviosidade durante todo o ano, além de invernos e verões menos rigorosos. Próximo ao Languedoc, o clima é parcialmente influenciado tanto pelo Atlântico, quanto pelo Mediterrâneo. As encostas do Maciço Central têm o clima mais continental, com verões mais quentes que o restante da região. E o extremo sudoeste recebe influência dos Pireneus, com um vento quente e seco que sopra no outono (efeito föhn).

As variedades bordalesas têm grande importância, principalmente nas proximidades Bordeaux. Por outro lado, a região conserva inúmeras variedades autóctones: algumas sairam ali para 'ganharem o mundo' - mais especificamente a Tannat e a Malbec, que hoje brilham na América Latina - mas a maior parte é desconhecida fora dali.

Enfim, a região tem muita história, muito tradição, e muitos vinhos diferentes.

Destaques

  • Tintos: a maior parte da produção é de vinhos tintos; na maioria, encorpados, com alta acidez e com taninos muito intensos. Nessa categoria, se destacam Cahors (terra da Malbec), Madiran (terra da Tannat) e Gaillac (com o corte Duras, Fer e Syrah). Para quem curte Bordeaux, Côtes de Bergerac pode ser uma alternativa interessante;
  • Brancos doces: outro destaque são os vinhos brancos doces, de colheita tardia. A principal referência é Jurançon, com exemplares intensos, complexos e com bom potencial de guarda. A AOP Monbazillac oferece vinhos botrytizados, de qualidade mais consistente que muitos Sauternes;
  • Armagnac: a região produz um destilado de vinho que rivaliza com Cognac - e provavelmente é mais antigo;
  • Variedades autóctones: não se pode deixar de mencionar a imensa lista de variedades raras que seguem cultivadas nos vinhedos do sudoeste (veja a sessão Variedades de uva, mais à frente).

História

Os vinhedos foram implantados pelos romanos em toda a área que corresponde ao sudoeste francês. A produção floresceu, e era exportada para Roma. Após a queda do Império, a produção se manteve sobretudo graças aos mosteiros, limitando-se ao consumo local.

No Século XII, todo o sudoeste francês (Bordeaux incluso) compunha o ducado da Aquitânia, dentro do reino da França. Com o casamento de Eleanor de Aquitânia com o rei Henrique II da Inglaterra em 1154, o ducado passou para o controle da coroa inglesa. Nesta época, se iniciou a exportação de vinhos a partir do porto de Bordeaux.

Até então, a Inglaterra somente tinha a disposição os vinhos acídulos produzidos no norte da europa. Com a Península Ibérica dominada pelos mouros, era impraticável contorná-la para ter acesso aos vinhos mais maduros do Mediterrâneo. Bordeaux, então, produzia muito pouco vinho. Em compensação, sua posição estratégica permitia receber todo o vinho do sudoeste (chamado à época de Haut Pays), que escoava pelos afluentes do rio Gironde até Bordeaux, para posteriormente seguirem em direção à Inglaterra.

Os comerciantes bordaleses logo perceberam a oportunidade, e passaram a plantar vinhedos sistematicamente ao redor de Bordeaux, com a intenção de abocanhar para si aquele mercado. No entanto, os vinhos produzidos ao redor da cidade eram ralos e fracos, sendo preteridos pelos importadores, em favor dos vinhos do Haut Pays. Em 1241, os comerciantes de Bordeaux conseguem do rei da Inglaterra um decreto que lhes garantia a preferência de comércio a partir de Bordeaux. Os vinhos do Haut Pays só poderiam chegar ao porto após o natal. Na prática, isso prejudicou muito a produção do Haut Pays, já que até o natal quase todos os navios já haviam partido para a Inglaterra.

Praticamente impedidos de exportar seus vinhos, só restou aos produtores do Haut-Pays a opção de vender parte de sua produção aos comerciantes bordaleses, que os misturavam a seus vinhos para melhorar sua cor. Os vinhos densos do sudoeste, com suas variedades como Malbec, Tannat, Duras, Fer, entre outras, tinham cor e estrutura intensas que ajudavam a incrementar os pálidos vinhos bordaleses, apelidados pelos ingleses de clarets.

A situação de Bergerac era mais semelhante à de Bordeaux. A área de vinhedos ao redor da cidade se expandiu muito principalmente a partir do Século XIII; e os produtores locais receberam em 1254 salvo-conduto do rei da Inglaterra para exportarem seus vinhos, apesar dos protestos e tentativas de sabotagens dos comerciantes de Bordeaux.

Toda a região voltou ao controle francês em 1453, mas o rei Carlos VII manteve a reserva de mercado bordalesa, para impedir uma rebelião. Ela só foi definitivamente eliminada em 1773, quando os vinhedos de Bordeaux já estavam mais do que estabelecidos em termos de reputação e qualidade. No entanto, os vinhos do sudoeste continuaram sendo usados para dar cor aos vinhos bordaleses (ao menos os mais baratos), até o estabelecimento do sistema de denominações de origem, em 1936...

A devastação dos vinhedos europeus causados pela praga da filoxera no final do Século XIX não deixou impune o sudoeste. Quase a totalidade dos vinhedos foi destruida. Como de praxe, após a descoberta da solução (a enxertia em raízes americanas), o replantio teve ênfase em variedades mais produtivas. Muitas provavelmente foram extintas, e outras tiveram drástica redução da área plantada. Mesmo assim, talvez devido ao caráter mais rural da região, e do menor apelo comercial da produção vinícola, o sudoeste foi a região que conservou o maior número de variedades autóctones: mais de uma centena.

Também digno de nota, alguns poucos vinhedos da região sobreviveram à filoxera até os dias de hoje. Graças ao terreno arenoso em que estão plantadas, a praga não consegue se desenvolver. Esses vinhedos se localizam dentro da área da AOP Saint-Mont, na Gasconha; e um deles, com mais de duzentos anos e um punhado de variedades não identificadas (todas cultivadas juntas), ganhou o título de patrimônio da humanidade [*].

Os vinhedos do sudoeste, entre Bordeaux e o Languedoc-Roussillon
(trabalho próprio, baseado no mapa obtido de Vin Vigne)

Variedades de uva

A proximidade com Bordeaux faz com que as variedades bordalesas - Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e Sauvignon Blanc - tenham papel muito importante. Nas áreas vizinhas, elas chegam a dominar os vinhedos, mas à medida em que se afasta de Bordeaux, elas perdem o protagonismo. Do lado oposto, percebe-se a influência do Loire e do Languedoc, com variedades como Gamay, Chenin Blanc e Syrah.

Mas o grande destaque da região são as muitas variedades autóctones. A região é a terra de origem da Tannat e da Malbec, que hoje são muito mais conhecidas por vinhos sulamericanos (Uruguai e Argentina, respectivamente), do que por suas regiões de origem. Além delas, possui diversas outras variedades, muitas só conhecidas na região, e que trazem uma grande quantidade de sabores distintos. Abaixo, segue uma lista das mais importantes:

  • Malbec: ganhou ascenção mundial devido aos vinhos argentinos, mas a região de origem da Malbec é a AOP Cahors, no vale do rio Lot. Diferente do estilo 'malbecão' argentino, os Malbecs de Cahors tendem a frutas mais frescas, toques herbáceos, além de maior acidez e adstringência. Além de Cahors, a Malbec, também conhecida como Côt, aparece como coadjuvante em algumas AOPs do sudoeste.
  • Tannat: ganhou o mundo nos braços do Uruguai, mas a Tannat é nativa da Gasconha, onde brilha principalmente na AOP Madiran. Também aparece como protagonista em algumas AOPs próximas à Gasconha. Diferente dos Tannats uruguaios, no sudoeste ela apresenta a intensa adstringência que lhe deu seu nome; por isso, ela sempre aparece em corte com outras variedades.
  • Fer Servadou: Também conhecida como Pinenc, Mansois, ou apenas Fer, é originária do Maciço Central, mas também figura como coadjuvante no restante do sudoeste. Gera tintos encorpados, frutados e de taninos firmes. Sua principal expressão está na AOP Marcillac.
  • Abouriou: variedade que quase foi extinta, foi resgatada por produtores na Côtes du Marmandais, que a têm como emblemática. No entanto, figura normalmente como variedade auxiliar, sempre em cortes.
  • Duras: acredita-se que tenha sido trazida para a região pelos romanos. Hoje, é cultivada principalmente em Gaillac, onde entra como uma das 3 protagonistas no corte típico da região. Gera vinhos encorpados, com muita cor e álcool. O nome faz referência à dureza de seus galhos e troncos, e não possui nenhuma relação com a AOP Côtes de Duras.
  • Prunelard: variedade tinta original de Gaillac, foi considerada extinta após a filoxera. Redescoberta em sua terra natal, vem sendo resgatada, e passou a ser permitida como coadjuvante nos tintos (máx. 10%).
  • Negrette: exclusiva da AOP Fronton, onde gera tintos macios e perfumados, e rosés encorpados. Possui muita matéria corante, taninos macios e acidez moderada.
  • Mauzac: variedade branca tradicional de Gaillac e Limoux (no Languedoc). Sua boa acidez lhe torna bastante adequada para produção de espumantes. Também é utilizada em vinhos brancos em algumas apelações do sudoeste.
  • Loin de L'Oeil: quase exclusiva de Gaillac, onde é usada em vinhos brancos secos, doces e espumantes, sempre em corte com outras variedades. Amadurece cedo, e costuma perder a acidez rapidamente, por isso precisa ser colhida cedo. Por outro lado, tem facilidade de desenvolver a podridão nobre, para produção de vinhos doces.
  • Ondenc: variedade branca do sudoeste, que antes da filoxera era muito difundida até em outras regiões da França. Apesar de gerar vinhos de alta qualidade, a baixa produtividade e suscetibilidade a apodrecimento pesaram contra ela. Atualmente, figura como coadjuvante em alguns vinhos brancos.
  • Ugni Blanc, Colombard, Folle Blanche, Baco Blanc: variedades brancas muito difundidas na Gasconha, tanto para produção de vinhos brancos, quanto do destilado Armagnac. As três primeiras também são usadas em Cognac. Já a última é uma híbrida, das raras a serem admitidas na França, e usada exclusivamente no Armagnac.
  • Gros Manseng e Petit Manseng: variedades predominantes nos brancos de Jurançon e de Pacherenc du Vic-Bilh. Ambas têm casca grossa e alta acidez, o que as fazem especialmente aptas para colheita tardia, a especialidade das duas AOPs. A principal diferença está no tamanho do fruto, a primeira é maior que a segunda.
  • Arrufiac e Petit Courbu: variedades brancas que costumam aparecer como coadjuvantes nos brancos (secos e doces) da Gasconha.
  • Baroque: variedade rara, restrita à AOP Tursan, onde é protagonista dos vinhos brancos. Gera vinhos com bom corpo e intensa acidez, com aromas de frutas brancas e vegetais.
  • Raffiat de Moncade: variedade branca muito rara, restrita à AOP Béarn. Gera vinhos leves, com notas de frutas brancas e florais.

Vinhedos do sudoeste (fonte: Interprofession des Vins du Sud-Ouest)

Sub-regiões


O Sud-ouest é tão vasto, que contém algumas regiões dentro de si. Bergerac é uma região de facto, dentro do sudoeste. Com um pouco de leniência, Também é possível entender a Gasconha ou as encostas do Maciço Central como regiões bem delimitadas e coesas. Polvilhadas ao redor das 3, o sudoeste apresenta ainda uma vasta lista de AOPs, bastante distintas entre si.

Apesar dessa falta de coesão, o sudoeste possui uma classificação em nível IGP, chamada Comté-Tolosan, que engloba quase todo o seu território, excluindo unicamente as áreas cercanas a Bordeaux, nomeadamente Bergerac, Côtes de Duras e du Marmandais. Como uma IGP, possui regras bem mais flexíveis, permitindo cortes de vinhos de diferentes partes do sudoeste.

À parte Bergerac, o sudoeste não possui sub-regiões oficiais. Sendo assim, há algumas abordagens diferentes de subdivisão regional, em termos de estilo dos vinhos e características climáticas. Abaixo, apresento uma divisão em 4 grupos:
  • Dordogne e Garonne médios: nos arredores de Bordeaux, os vinhos tendem a mimetizar os da vizinha mais famosa. Neste grupo, se encaixa Bergerac, e também algumas AOPs próximas a Bordeaux;
  • Massif Central: na parte mais continental, nos vinhedos situados às encostas do maciço, predominam tintos a base de Fer Servadou;
  • Gasconha e Pireneus: a Gasconha é a terra da Tannat, e ela protagoniza os tintos da região. Também é a terra do destilado Armagnac. Outro destaque são os vinhos brancos doces, de colheita tardia, de Jurançon e Bacherenc du Vic-Bilh, cuja tipicidade remete aos ventos dos Pireneus;
  • Lot et Tarn: na 'meiuca', entre a Gasconha, Aveyron e Bergerac, e às margens dos rios Tarn e Lot (e também do Garonne), há um punhado de denominações de origem, cada uma com sua particularidade. A mais famosa delas é Cahors, origem da Malbec.
A seguir, apresento com mais detalhes cada um desses grupos.

Dordogne e Garonne médios

Os rios Dordogne e Garonne se unem para formar o Gironde, com os 3 rios definindo as sub-regiões de Bordeaux. No entanto, pouco antes de entrarem em Bordeaux, as margens dos dois rios estão apinhadas de vinhedos. O clima e solo são muito similares às sub-regiões limítrofes de Bordeaux; e as variedades bordalesas predominam de forma esmagadora. Como resultado, os estilos dos vinhos tendem a mimetizar os da vizinha famosa.

Vinhedos de Bergerac et Duras (fonte: Interprofession des Vins du Bergerac et Duras)

Bergerac

À margem do Dordogne, os vinhedos ao redor da cidade de Bergerac formam uma região em si, com 9 AOPs, sendo duas regionais e outras 7 comunais. A AOP Bergerac engloba tintos, brancos e rosés, que via de regra são básicos, rústicos, para consumo em curto prazo. Já a AOP Côtes de Bergerac engloba tintos secos e brancos doces, de qualidade superior, e com maior potencial de guarda.

Os tintos são normalmente baseados no corte bordalês, com Merlot, Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc. Os brancos também costumam ser baseados nas variedades bordalesas, com a adição da menos conhecida a Sauvignon Gris - uma mutação da Sauvignon Blanc de casca rosada. A região ainda produz uma grande quantidade de vinhos doces e semi-doces.

As AOPs comunais, cada uma tem um foco específico:
  • Montravel: produz principalmente brancos secos. Desde 2001, também inclui tintos;
  • Haut-Montravel e Côtes-de-Montravel: vinhos brancos moelleux (meio-doces), dentro da mesma área de Montravel;
  • Monbazillac e Saussignac: vinhos botrytizados, ao estilo de Sauternes;
  • Rosette: vinhos brancos doces e meio-doces (moelleux);
  • Pécharmant: exclusiva de vinhos tintos bem conceituados, porém a produção é tão pequena, que raramente são encontrados fora de Bergerac.

Ainda ao redor de Bordeaux

A AOP Côtes de Duras se encontra imediatamente ao sul de Bergerac, e recentemente uniu com esta região seu comitê interprofissional. A meio caminho entre os dois rios, Côtes de Duras faz divisa com a sub-região bordalesa de Entre-Deux-Mers. E assim como esta, o destaque é de vinhos brancos, mas além das bordalesas, são permitidas outras variedades como Mauzac, Ondenc, Chenin Blanc e Ugni Blanc. Os tintos e rosés se limitam às variedades de Bordeaux.

A AOP Côtes du Marmandais é dividida ao meio pelo Garonne, e faz divisa com as sub regiões bordalesas de Graves e Entre-Deux-Mers. Mais uma vez, as variedades bordalesas também são protagonistas, mas o diferencial é a tinta Abouriou, específica da apelação. Rio acima, já na divisa com a Gasconha, a AOP Buzet se limita às variedades bordalesas, produzindo vinhos nas 3 cores.


Maciço Central

No extremo leste, no departamento de Aveyron, os vinhedos se localizam nas encostas do Massif Central, um grande maciço que ocupa o centro-sul da França. Possui o clima mais continental de todo o sudoeste, com pouca influência atlântica. Toda a área é coberta pela IGP Aveyron. Além dela, há 4 AOPs comunais.

Esta é a terra natal da Fer Servadou. A principal expressão está na AOP Marcillac, a mais conceituada das 4. É exclusiva de tintos a base de Mansois (como é conhecida em Marcillac), que pode ser complementada por pequenas quantidades de Cabernet Sauvignon, Merlot ou Prunelard. Próximas a Marcillac, as AOPs Entraygues - Le Fel e Estaing também produzem tintos com base em Fer (com variedades bordalesas como auxiliares); mas permitem rosés e brancos. Estes últimos, são feitos a base de Chenin Blanc e Mauzac.

Um pouco mais ao sul, mais perto do Languedoc do que do restante do sudoeste, a AOP Côtes de Millau sofre tanto influência mediterrânea quanto atlântica. O foco está nos tintos a base de Gamay e Syrah, tendo Fer e Duras como auxiliares. Também produz rosés, e brancos (Chenin Blanc e Mauzac). Uma curiosidade: Côtes de Millau se sobrepõe a um outro produto com denominação de origem - no caso, do autêntico queijo Roquefort.


Gasconha e Pireneus

Ocupando o 'centro do sudoeste' (se me permitem o joguete geográfico), o departamento de Gers é o coração da histórica Gasconha. Pouco mais ao sul, estão os Pireneus, e a fronteira com a Espanha. Essa área tem como destaques a Tannat, o Armagnac, e vinhos brancos de colheita tardia, produzidos sobretudo com a Gros e Petit Mansengs.

Armagnac

Os vinhedos do departamento de Gers são dominados por uvas brancas como Ugni Blanc, Folle Blanche, Colombard e Baco Blanc, entre outras. Além de vinhos brancos pela IGP Côtes de Cascogne, essas uvas são usadas para produzir o destilado Armagnac. O Armagnac é normalmente destilado em destiladores de coluna, e posteriormente envelhecido em barris de madeira. De acordo com o tempo de envelhecimento, pode ser classificado como VS (1 a 4 anos), VSOP (4 a 10 anos) ou XO (mais de 10 anos). Uma exceção é o Blanche Armagnac, engarrafado sem envelhecimento em madeira, conservando a cor transparente.

Tannat

Ao sul da Côtes de Gascogne, está a AOP Madiran, terra de excelência da Tannat. Diferentemente dos macios Tannats uruguaios, em Madiran ela possui taninos intensos, e por isso é complementada com variedades auxiliares, como Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Fer Servadou, para suavizar a adstringência. Madiran produz exclusivamente tintos, mas a mesma área corresponde à AOP Pacherenc du Vic-Bilh, para produção de vinhos brancos, doces e secos.

Além de Madiran, a Tannat é fundamental no restante dos tintos Gasconha e dos Pireneus. As AOPs Saint-Mont, Tursan, Béarn e Irouleguy produzem tintos e rosés a base de Tannat, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon e Fer Servadou. Entre os rosés, se destacam os de Irouleguy, populares na costa basca francesa. São encorpados, de cor rosada profunda, e muito adequados à culinária local. Diferentemente de Madiran, as 4 também produzem vinhos brancos; em geral, a base das Mansengs e Courbu, eventualmente com Sauvignon Blanc ou variedades locais. A exceção são os brancos de Tursan, a base de Baroque.

Colheita tardia

Uma das especialidades dessa parte do sudoeste são os vinhos brancos doces, resultado de colheita tardia, graças aos Pireneus. Das montanhas, descem ventos quentes e secos, sobretudo no outono, devido a um fenômeno conhecido como efeito föhn. Esses ventos permitem que as uvas sejam mantidas sãs nos pés até novembro, quando são colhidas já passificadas. Duas AOPs se especificaram em vinhos doces, graças a esse fenômeno: Jurançon, nas encostas dos Pireneus, e Pacherenc du Vic-Bilh, ao sul da Gasconha.

Em Jurançon, as principais variedades são Petit e Gros Manseng, que possuem casca grossa, e são capazes de manter alta acidez mesmo quando sobremaduras. Após a fermentação, estagiam em barricas de carvalho. O resultado são vinhos doces complexos, com muita acidez e longa capacidade de guarda. Devido a uma tendência de mercado, a versão seca, Jurançon Sec, tem ganhado visibilidade. Os vinhos doces de Pacherenc du Vic-Bilh têm um estilo mais jovial e fresco; e a AOP também produz versões secas. As variedades utilizadas são Petit Manseng, Gros Manseng, Petit Corbu e Arrufiac.


Lot et Tarn (et Garonne)

A bacia do rio Garonne, com seus afluentes Tarn e Lot abrange uma larga área do sudoeste, nos departamentos de Haute Garonne, Tarn, Tarn et Garonne, e Lot (Percebeu o padrão?). Esta área possui 6 AOPs, cada uma com suas particularidades. Exceto por Gaillac, que produz vinhos em todos os estilos, o restante produz exclusivamente tintos e rosés.

No alto Garonne, a AOP Saint-Sardos produz tintos e rosés de Syrah com Tannat, num mix de Gasconha com Languedoc. Bem ao lado, a AOP Fronton tem seus vinhos baseados em uma uva pouco difundida chamada Negrette. Ela deve representar pelo menos 50% do vinho, que pode ser complementado por Syrah, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Fer. Varietais de Negrette, apesar de pouco potencial de guarda, são populares por serem macios e perfumados. Um pouco mais a oeste, a AOP Brulhois é um meio termo entre a Gasconha e Bordeaux. Seus vinhos são baseados em Merlot, Tannat e Cabernet Franc, tendo a Cabernet Sauvignon, Malbec e Fer Servadou como auxiliares.

Cortada pelo rio Lot, a AOP Cahors (somente tintos) é a terra natal da Malbec. Relativamente afastada do Atlântico, o clima de Cahors tende ao continental, com verões mais ensolarados que Bordeaux, e por isso mais adequada à Malbec. No entanto, também pelo fator climático, os Malbecs de Cahors são bem diferentes dos argentinos: são mais frescos, com mais acidez, mas também mais adstringentes e com notas vegetais. Tannat e Merlot costumam ser usados como complementares, mas as Cabernets não são autorizadas.

Logo ao sul de Cahors, a AOP Coteux du Quercy produz tintos e rosés. Curiosamente, é a única AOP de todo o sudoeste a priorizar a Cabernet Franc. Merlot, Tannat, Malbec e Gamay podem ser usadas como coadjuvantes. Assim como Cahors, tem clima predominantemente continental, com verões mais quentes que as AOPs mais costeiras.

Gaillac

Finalmente, ocupando boa parte do departamento de Tarn, está a AOP Gaillac, uma das mais antigas e tradicionais da França. Próxima a Toulouse, está mais perto do Mediterrâneo do que do Atlântico. Seus tintos, bem conceituados, são baseados no corte Duras, Syrah e Fer, que juntas devem representar ao menos 60% do vinho. Os brancos, em todos os níveis de doçura, são feitos principalmente a partir de Loin de L'Oeil, Mauzac e Muscadelle. Ondenc e Sauvignon Blanc podem entrar no corte como coadjuvantes.

Gaillac é também a única AOP de espumantes no sudoeste. Eles podem ser feitos pelo método tradicional, ou méthode ancestrale - em que a fermentação finaliza na garrafa, resultando em espumantes mais doces e turvos. E por fim, a AOP também permite rosados e vinhos em primeur (ao estilo Beaujolais Nouveau), mas estes não chamam muito a atenção.

Referências

2 comentários:

  1. Excelente relato sobre esta regiao da Franca, que realmente acaba sendo pouco divulgada e ofuscada pelas "mais importantes"... Parabens

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