10 de março de 2016

Dois Meursaults de um mesmo vinhedo

Dia desses, participei de uma degustação interessante, de dois brancos de Meursault, provenientes do mesmo vinhedo, e da mesma safra: de um lado, Nicolas Potel Clos de la Baronne 2010, e do outro, Château Labouré-Roi Clos de la Baronne 2010.

Contextualização

Meursault, para quem não conhece, localiza-se na Côte d'Or, uma estreita faixa de terra onde se localizam quase todos os Grand Crus da Borgonha, exceto por Chablis. Meursault, mais especificamente, se localiza na parte sul da Côte d'Or, uma área de excelência da Chardonnay. Diferentemente de Chablis, os Chardonnays de Meursault tendem a ser mais marcados pelo envelhecimento em madeira, sendo portanto mais untuosos, amanteigados, e oferecendo aromas de frutos secos, como amêndoas, avelãs, mel e tostados.

Mais do que a mesma AOC, os dois vinhos são provenientes da mesma vinha, chamada Clos de la Baronne. É uma parcela 2,4 hectares dentro do lieut-dit de Les Meix Gagnés, encostada na área urbana da vila de Meursault. Como um vinhedo localizado na borda da vila, não é dos mais importantes da região, mas exatamente por isso, tem vinhos de preços mais acessíveis.

Pesquisando a respeito, descobri que o Clos de La Baronne faz parte do grupo de propriedades do Domaine René Manuel [*], que em 1998 foi comprado pela Maison Labouré-Roi - um grande négociant-éleveur da Borgonha, e que vem a ser o produtor de um dos vinhos deste texto. Porém, 2010 foi a última safra deste vinhedo com o nome da maison, já que ela vendeu o Domaine Manuel para um grupo de investidores americanos [*][**].


Apenas um nome

Vendo os nomes dos dois vinhos, poderia-se inferir que se tratam de dois produtores diferentes, dividindo a mesma vinha, o que não é incomum na Borgonha, mas este não é exatamente o caso. Aqui, o que aconteceu é que as duas marcas pertencem aos mesmos donos. Nicolas Potel criou sua empresa em 1997, mas em 2002, necessitando de capital, a vendeu ao grupo familiar Cottin Frères, que já era proprietária do Labouré-roi [*].

Nicolas Potel manteve o controle da produção até 2008, porém se desligou definitivamente para iniciar outro projeto próprio; mas seu nome permaneceu como marca dos irmãos Cottin [*] [**]. Ou seja, tudo o que leva o nome Nicolas Potel a partir de 2008, na realidade não tem participação do mesmo. Sendo assim, os dois vinhos da degustação foram na realidade produzidos pela mesma empresa.


Um produtor, dois vinhos distintos

Mesmo que tenham exatamente a mesma origem, tratam-se de dois vinhos bem distintos. O Nicolas Potel tem cor amarelo-acobreada de intensidade muito baixa, e pouco brilho, o que dava a impressão de um vinho mais elegante, e discreto. Mas, se mostrou exatamente o contrário: intenso e marcante. O aroma é intenso, dominado pela influência da madeira, com notas tostadas, de caramelo e coco. De fruta, mostra uma discreta calda de abacaxi. Na boca, mostrou-se untuoso, encorpado, com acidez adequada (média+), sabor intenso, amendoado e muito tostado, e alta persistência aromática. Para o meu paladar, sobrou madeira. Alguém disse: parecia mais um Chardonnay da Califórnia, do que da Borgonha, o que concordo plenamente.

Já o Labouré-Roi foi exatamente o contrário. A cor - a mesma tonalidade acobreada - tinha intensidade média, mais brilhante. Já o aroma, um pouco mais comedido, mostrou madeira equilibrada, e notas terciárias. Apresentou o mesmo abacaxi em calda discreto, junto a folhas murchas, biscoito, favo de mel, e uma nuance tostada mais discreta. Na boca, tinha acidez alta, mais em destaque do que o primeiro vinho, e menos untuosidade. O aroma de boca confirmava o biscoito e a cera de abelha, e a persistência era tão longa quanto o primeiro, com retrogosto dominado pelo mel e notas tostadas. Muito melhor do que o primeiro.

Tratando-se de um rótulo que não faz mais parte do portfólio do grupo, não consegui encontrar fichas técnicas de nenhum dos dois. Mas se há algo que difere muito entre eles é o uso da barrica. Se podemos inferir que estes vinhos seguem os respectivos padrões de cada uma das marcas, é de se supor que o primeiro teria estagiado 100% em barricas novas, por 10 meses. Já o segundo, entre 8 e 12 meses, porém com apenas 25% de barricas novas, com barris de 3 a 4 anos. O que estaria completamente de acordo com as características identificadas nos vinhos.


Fontes

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