6 de março de 2013

Auchentoshan


Em minha viagem pela Irlanda, aproveitei para conhecer tudo o que há de whiskeys irlandeses (veja aqui). Mas na Escócia não é assim tão fácil, pois o país possui uma infinidade de destilarias e marcas diferentes. Além disso, minha passagem pelo país foi bem mais curta, e por isso, só tive tempo de visitar uma destilaria: a Auchentoshan (pronuncia-se 'ó-can-tó-chan'). É a destilaria mais próxima da cidade de Glasgow, e pode-se chegar até ela com ônibus municipal. Tomamos o ônibus 66, e depois de mais de 1h30, chegamos ao ponto final, a menos de 10 minutos da destilaria.

Ela fica nas Lowlands, no sul do país, região de whiskies tradicionalmente mais suaves, menos ou nada defumados. Hoje pertence ao grupo Santori, do Japão, junto a outras 2 destilarias escocesas: Bowmore - a mais conhecida - da ilha de Islay, e Glen Garioch, nas Highlands.

Visita

Por coincidência - pois eu não sabia nada sobre eles antes da visita - o método de produção é muito similar ao dos whiskeys irlandeses: não se utiliza turfa na maltagem, produz-se apenas single malts, e destilam o produto 3 vezes. É a única destilaria escocesa a realizar a tripla destilação.

Pelo menos nesta época do ano (princípio de março), com temperatura ambiente beirando 0ºC, não parece ser um destino muito requisitado, pois na minha visita, havíamos apenas eu e meu irmão. Tivemos um tour dedicado, o que nos permitiu fazer muito mais perguntas, olhar tudo sem cabeças à frente, e sem pressa. E para melhorar, a guia era degustadora da fábrica, então conhecia muito bem os produtos que estava mostrando.

E apesar da falta de visitantes, o que vimos lá dentro foi um espaço muito bem preparado para nos receber, como se tivesse sido desenhado com este propósito. As salas eram bem iluminadas, havia sempre espaço suficiente para um grupo de visitantes, todas as paredes eram brancas, e freqüentemente exibiam a marca da empresa (para aparecerem no fundo das fotos). Além disso, não havia aquele cheiro de cerveja fervendo, como ocorreu em Bushmills.

Na primeira sala, há o início da tour, com dados de mercado sobre a empresa, em frente a um mapa do país, localizando as três empresas do grupo. Em seguida vemos, por uma janelinha de vidro, o malte de cevada já triturado caindo pelo sistema, alimentando o enorme tanque onde será misturado com água e cozido a 93ºC, para se extrair os açúcares dos grãos, no processo chamado de brassagem. A guia abriu um dos tanques, para vermos as pás revirando a pasta de grãos, nublada pelo vapor d'água.

Na sala seguinte, abriu o tanque de fermentação, para vermos o líquido espumando, e nos convidou a sentir o aroma exalado. O responsável pelo nítido aroma de pão de banana são as leveduras exclusivas da fábrica, que hoje são cultivadas em um laboratório do grupo na África do Sul. A fermentação leva 3 dias, e o líquido termina com 8% de teor alcoólico.


Na seqüência, diante dos três alambiques de destilação, a guia nos explicou o processo. No início da primeira destilação, o líquido que decanta é muito oleoso. Esta parte, chamada de cabeça (em inglês, head, ou foreshot) deve ser eliminada. Um pequeno frasco em uma mesa à nossa frente continha uma amostra da 'cabeça'. O aroma lembrava o de azeite. A 'cauda' (parte final da primeira destilação) também é descartada. Estes descartes ocorrem apenas na primeira destilação.

Ao final da terceira, o líquido já tem 81% de teor alcoólico. E outros frascos à nossa frente contém amostras do resultado de cada uma das destilações. O aroma de pão de banana se perde já na segunda destilação, e após a terceira, o cheiro fica parecido com cachaça, porém com muito mais álcool.


Após esta etapa, vamos até o galpão de envelhecimento, onde apenas podemos ver os barris através das grades. Utilizam-se principalmente as barricas provenientes de Bourbon, e em menor escala, Jerez Oloroso e Pedro Ximenes. Há ainda o uso de barricas provenientes de Jerez Fino e de vinho fino, usados apenas em linhas de edição limitada.

Degustação

A visita termina na sala de degustação, onde a guia nos apresentou as 5 linhas regulares.
  • Classic: envelhecido 6 anos, em barris de Bourbon;
  • 12 anos: parte envelhecido em Bourbon, e (uma pequena) parte em Jerez Oloroso;
  • Three Wood: todo o produto passa os primeiros 10 anos em Bourbon, e em seguida passa 1 ano em oloroso, e mais um ano em Pedro Ximenes. Este último é um tipo de Jerez muito doce, por isso a sua influência no vinho é muito perceptível;
  • 18 anos: é o irmão mais velho do Classic, envelhecido apenas em barris de Bourbon;
  • 21 anos: assim como o 12 anos, parte em barris de Bourbon, e parte em oloroso;

Mas apesar da apresentação, a degustação contemplou apenas o produto mais básico da casa. O Classic lembrava um pouco o aroma de banana da fermentação. Na boca, tinha uma certa salinidade, e pungência. No aroma de boca sobressaiu a garapa. Interessante, mas não me conquistou.

O produto que mais me chamou a atenção foi o Three Wood. Devido ao uso das barricas alternativas, ele se destacava já no visual, com cor bem mais escura, como é possível ver na foto acima. Mas como a guia não me ofereceu uma amostra, para saciar minha curiosidade, comprei apenas uma garrafinha de 50mL. Aproveitei, e comprei também uma garrafinha do 18 anos.

O 18 anos é muito parecido com o Classic. Tem 12 anos a mais em barris de Bourbon, mas pouca coisa mudou, além do preço.

Já o Three Wood confirmou a minha expectativa, mostrando como as barricas de Jerez contribuem demais no sabor do whisky. Aromático, macio, de paladar adocicado devido ao Pedro Ximenes, lembrando frutas secas, como uvas passas, e com aromas olorosos (amêndoas tostadas) no retrogosto. Com seu preço inferior a £40, tem excelente relação custo-benefício. Se eles tivessem me dado a provar este whisky na degustação, eu teria levado uma garrafa. Mas, perderam a venda.

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