7 de fevereiro de 2013

Guinness em Dublin

Eu não poderia visitar Dublin e não tomar algumas Guinness em um pub local. Mas curioso que sou, fui também à Guinness Storehouse, um museu dentro das dependências da fábrica desta icônica cerveja. A visita é apenas isso, um museu. E como na Jameson, não pude passar nem perto da produção. Na visita auto-dirigida, eu passeei por painéis, fotos e videos contando um pouco da história e da produção da bebida. Mas pelo menos aprendi a tirar minha própria "perfect pint of Guinness" a partir de um barril.


O que vi no museu

A historia da Guinness começou quando Arthur Guinness recebeu uma herança de £100, e investiu arrendando uma cervejaria abandonada, na cidade de Dublin, no ano de 1759. Ele começou produzindo cerveja clara, no estilo ale, mas logo tomou conhecimento das cervejas estilo porter, que começavam a ser produzidas em Londres. Começou a produzir neste estilo nos anos 1770. No entanto, a sua porter se diferenciava das outras por ser mais 'stout' (encorpada) que as demais. Com o sucesso, em 1799, a fábrica se concentrou exclusivamente na produção de porters. Apenas no meio do século seguinte, o seu estilo da cerveja passou a ser chamado stout, e copiado mundo afora.

A cerveja é feita de 4 ingredientes: cevada maltada torrada e não torrada, água, lúpulo e fermento. A água vem das montanhas Wicklow, uma belíssima região ao sul de Dublin, que fornece água para toda a capital. A cevada maltada e lúpulo são comprados de fora, mas o fermento é cultivado dentro da fábrica, pelo menos desde o seculo XIX (não existem registros anteriores a respeito, mas a lenda é de que o mesmo fermento é cultivado desde a época de Arthur Guinness.

O processo começa com parte da cevada sendo torrada. Em seguida, os grãos torrados e não torrados são triturados juntos, e misturados com água quente (mashing). Ao final do processo, a parte sólida é retirada, e vendida como adubo, ou suplemento alimentar para rebanhos. A parte líquida, que forma o mosto, segue para a fermentação. Todos os passos até aqui ocorrem exclusivamente em Dublin. Já da fermentação em diante, o processo pode continuar em diversos países: o mosto - acrescido de lúpulo - e o fermento são enviados para fábricas em diversos países para a seqüência da produção: Canadá, Austrália, Jamaica, Tailândia, Nigéria...

Em cada uma das fábricas, o fermento é adicionado ao mosto, e a fermentação se inicia, durando 2 dias. Ao final do processo, o fermento, que flutua sobre a cerveja, é retirado, e o líquido é transferido para tanques de maturação. Hoje, a maturação ocorre em tanques de aço, mas por muitas décadas era feita em barris de carvalho reacondicionados (de whiskey).

Após a maturação, adiciona-se o gás, e a cerveja é engarrafada. Aliás, outra peculiaridade da cerveja é que 80% do gás adicionado (para formação do creme) é nitrogenio. Os outros 20% são de gás carbônico, que é normalmente o gás usado na maioria das cervejas.


The perfect pint

Em uma sessão do museu, há uma demonstração de como se deve tirar um pint perfeito de Guinness. Primeiro vemos a demonstração, e em seguida, cada um dos presentes tem a sua vez para tentar tirar um pint.

As instruções seguem: ao servirmos um copo, devemos enchê-lo até 75% aproximadamente da capacidade, com o copo a 45º de inclinação. No pint original da Guinness, é aproximadamente até o símbolo da marca. A cerveja fica inicialmente turva, e é necessário esperar líquido se estabilizar, eliminando o nitrogênio. Em seguida, completamos o copo, com a torneira ao reverso, para colocar o creme. Ainda é necessário esperar novamente o líquido se estabilizar, antes de beber. Não é que vá fazer mal, é apenas um sacrilégio tomá-la antes.

O processo todo, de acordo com a empresa, se feito corretamente, deve levar 119,5 segundos... (ah vá). E ainda por cima, os funcionários juram que a cor da cerveja não é preta, e sim vermelho rubi escuro (dark rubi red). Ao se olhar o copo contra a luz, é possível ver algum resquício de vermelho nos cantos do copo; mas é difícil ser mais preta que ela.


E o sabor

Uma coisa que não dá pra negar é que a Guinness - servida de um barril - é realmente uma cerveja diferente. Para começar, é mais macia que outras cervejas, por conter muito menos gás carbônico. E, apesar de ser considerada a mãe das stouts, ela é mais leve, e menos torrada que outras stouts que eu tenha tomado.

Existe um mito de que a Guinness na Irlanda é muito melhor do que em qualquer outro lugar do mundo, porque ela "não viaja bem". Bem, pelo fato ser de produzida em diversos lugares, esse mito cai por água abaixo. E apesar de ser produzida em diversos países, os ingredientes - incluindo a água e o fermento - são necessariamente os mesmos. Inclusive existe o boato que a Guinness servida na Irlanda seja fermentada na África (é a globalização).

Então o que faz a maioria das pessoas gostarem mais da cerveja ao tomarem lá do que em outro lugar? Creio que o ambiente conta: tanto o clima quase sempre chuvoso e frio da ilha, quanto o clima de pub irlandês, cheio de gente descontraída, bebendo ao som de boa música ao vivo. Fica melhor ainda se a música for irlandesa, e o povo, local, estiver dançando (presenciei uma vez, de diversos pubs que visitei na ilha toda). Mas eu creio que o principal motivo pra Guinness na Irlanda parecer especial é porque quando chegamos lá, e pedimos uma Guinness, queremos que o momento seja especial.

Guinness na culinária

O que é muito diferente é a cerveja em lata. Ela vem com uma bolinha de plástico dentro, que teria o propósito de ajudar a simular o efeito de um barril pressurizado. Nem vale a pena perder tempo com ela. Guinness é no barril, from the cask. Seja em Dublin, ou em qualquer lugar do mundo.

A utilidade da cerveja em lata é outra: preparar dois (ou um) dos pratos mais gostosos da Irlanda. O beef and Guinness stew (guisado) ou pie (torta). O guisado leva carne de boi, cenouras, batatas, salsão e temperos. A torta, por sua vez, é o guisado com uma massa folhada cobrindo-a. Eu e a Thais provamos algumas vezes, e tentaremos reproduzi-la, ao chegarmos em casa.

beef and Guinness stew

Um comentário:

  1. Vamos experimentar aqui em Cuiabá,quando a Thais vier e fazer uma imitação com carne de cordeiro.

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