27 de agosto de 2015

Os vinhos dos Cavaleiros Templários

Jerusalém, anno domini 1118, um grupo de monges cavaleiros que participaram da Primeira Cruzada fizeram voto de juramento para proteger os peregrinos que se dirigiam à Terra Santa, somando mais um aos votos a que já se submetiam, de pobreza, castidade e obediência. Com a graça do Rei Balduíno II de Jerusalém, se estabeleceram inicialmente no Templo de Salomão. Nascia, assim, a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, que mais tarde ficou conhecida como Ordem dos Cavaleiros Templários.

Com a bênção da Igreja, a Ordem cresceu rapidamente, recebendo doações de terras, dinheiro, e filhos de famílias nobres, que desejavam ajudar na causa da luta pela Terra Santa. Rapidamente, estavam estabelecidos em toda a Europa e Terra Santa, e criaram o primeiro sistema de transferência de valores, com cartas de crédito; um traveler check medieval. Um peregrino depositava valores a uma unidade local da Ordem, e viajava portando uma carta de crédito nominal, para retirar um valor equivalente no destino. Desta forma, os peregrinos tinham menos riscos de terem todos os seus bens roubados durante a viagem.

Após a aprovação Papal, em 1129, passaram a usar mantas brancas sobre suas armaduras, e adotaram um Código de Conduta com 72 cláusulas, que definiam o comportamento apropriado de um Cavaleiro Templário. No entanto, seu código de conduta se expandiu ao longo do tempo, até chegar a 609 cláusulas. Este ideal de comportamento estrito inspirou o grito de guerra destes cavaleiros: Beau-séant, que em francês arcaico significa "portando-se bem", ou "portando-se corretamente" [*]. Este é também o nome do estandarte de guerra, pelo qual eram conhecidos. O estandarte, inicialmente, era de duas cores, com a metade superior preta e a de baixo branca, assim como cavalos escuros de patas brancas, que em francês são conhecidos como balsannes (e em francês arcaico, baucent [*][**]). A partir de 1146, acrescentaram a cruz vermelha aos seus uniformes e ao estandarte, após autorização dada pelo Papa Eugenius III.


Declínio

Ao final do século XIII, eles possuíam uma fortíssima influência em toda a Europa cristã, que se sobrepunha ao dos reis, e chegava até mesmo a se equiparar ao poder da Igreja. Porém, no Oriente, os muçulmanos se fortaleceram, e retomaram Jerusalém e outros reinos mais a norte. Estas derrotas no Oriente abalaram um pouco a credibilidade da Ordem, e deu margem a uma ação de difamação por parte de reis que queriam derrubá-la, como o Rei Felipe IV da França, que lhe devia grandes fortunas. Essa difamação culminou em uma ordem de prisão sincronizada, a mando do Papa Clemente V, no dia 13 de outubro de 1307. Os Cavaleiros foram torturados para confessarem crimes de heresia, blasfêmia, fraudes financeiras, entre outras acusações. Ao final, vários membros foram queimados em fogueira, a Ordem foi extinta em 1312, e todos os bens e posses foram transferidos para outras ordens.


A nova ordem

Apesar de ter sido oficialmente extinta em 1312, um médico francês, de nome Fabré-Palaprat, resolveu fundar em 1804 uma ordem que clamava para si a tradição dos Cavaleiros Templários, mesmo sem alegar uma herança ou descendência direta com a antiga ordem. A Ordem Militar Soberana do Templo de Jerusalém é reconhecida pelas Nações Unidas, e possui representantes em diversos países. Eles não possuem o caráter militar (apesar do nome), e são apenas uma entidade internacional cristã, dedicada a trabalhos humanitários e à preservação de locais sagrados.

Sob pedido da Ordo Supremus Militaris Templi Hierosolymitani – Magnus Prioratus Magistralis Bulgariae, o braço búlgaro da entidade, a vinícola Stambolovo, da Trácia, produz uma linha de vinhos em homenagem aos Cavaleiros Templários. E a Winelands, importador da vinícola no Brasil, trouxe alguns desses rótulos, que tive a oportunidade de provar, e são vinhaços para ninguém botar defeito.

Dois cortes de Merlot e Mavrud, para acompanhar ragu de rabada com puré de mandioca.

Vinhos

O 1118 Merlot & Mavrud 2008 faz referência à data de fundação da ordem. Mavrud é uma variedade típica da Trácia, com boa concentração de acidez e taninos, além de aromas de frutos negros e um toque defumado. Já a internacional Merlot se adaptou muito bem na Trácia, produzindo alguns dos melhores vinhos da região. Mesclar a Merlot e a Mavrud é quase elementar, já que os taninos macios da primeira ajudam a amenizar os taninos mais rústicos da segunda. Este vinho, que tende mais para a maciez da Merlot, é super elegante, com muitas frutas negras e especiarias doces no aroma.

Já o Templar Knight Merlot & Mavrud 2008, feito com as mesmas variedades do anterior, se mostra um pouco diferente, com um pouco mais de pegada. Ligeiramente mais rústico, mas com excelente acidez e aroma defumado mais pronunciado, ficou excelente com ragu de rabada. Recomendo fortemente para aqueles que gostam de se aventurar nos sabores mais exóticos do mundo do vinho.

O Beau-séant Merlot 2008 tem o nome do estandarte - e também do grito de guerra - dos Cavaleiros Templários. É 100% Merlot, sendo um excelente exemplo de como esta variedade se expressa bem na Trácia. Equilibrado, um toque balsâmico já mostrando alguma evolução, com taninos plenos e macios, muito agradáveis, e boa acidez, ele possui uma elegância comparável aos melhores tintos do velho mundo.

Por fim, o Templar Knight Cabernet Sauvignon 2011 é o único feito de Cabernet Sauvignon. Ele é também o único que não é de 2008, sendo o mais jovem dos quatro. Macio, fresco, com muita fruta, influência bem dosada da barrica, é muito agradável para beber já. No entanto, seguramente tem vários anos pela frente, a julgar pelo Templar Knight Cabernet Sauvignon 2006, que tomei no ano passado. Ou seja, este 2011 tem muito potencial para envelhecer bem.

São 4 excelentes exemplares, que representam muito bem a qualidade dos vinhos tintos da Bulgária. Vinhos elegantes, sem exageros, e com bom potencial de evolução. E principalmente, com ótima relação preço-qualidade.

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