11 de agosto de 2017

Um bolo de aniversário e um Colheita Tardia da Suíça

Em turma de vinho, quando tem aniversário, até o bolo vai com vinho. No final do mês passado, nos reunimos para comemorar o aniversário de duas confrades, e o nosso confrade Chef Alê se encarregou de fazer um bolo para comemorar. O bolo foi recheado com "baba de moça" - um creme com coco e abacaxi - e coberto de um merengue com raspas de limão, pra dar um toque cítrico. É redundante dizer que estava uma delícia.


A ocasião foi perfeita para abrirmos o Domaine Tourbillon 2008, um vinho de colheita tardia da Suíça (AOC Valais). É produzido pela Provins que, além de um dos maiores produtores do país, é o maior exportador de vinhos. Já comentei aqui a respeito de alguns vinhos desta cooperativa.

Domaine Tourbillon

O nome do vinho faz referência ao Château de Tourbillon, castelo medieval construído sobre uma colina abrupta, próximo à cidade de Sion, na Suíça. O castelo foi construído em 1294, destruído por um incêndio em 1788, e hoje suas ruínas são um importante sítio histórico do país, aberto a visitações. As uvas usadas para produzir este vinho foram provenientes dos vinhedos existentes aos pés dessa colina. A produção é bem pequena: em 2008, foram 840 garrafas numeradas (a nossa foi a de número 610).

As ruínas do Château de Tourbillon (fonte: TrekEarth)

Grain Noble ConfidenCiel

O vinho era 100% Marsanne, uma variedade chave nos brancos do Rhône sul, na França. Mas na Suíça, ela é mais comumente referida como Ermitage, e é uma das favoritas para produção de vinhos de colheita tardia e botrytizados.

Ele recebeu o selo Grain Noble ConfidenCiel, que corresponde a uma garantia de qualidade para vinhos doces feitos de grains nobles, no Cantão de Valais. O termo grains nobles implica que (pelo menos uma pequena) parte das uvas usadas no vinho tenham sido acometidas pela "podridão nobre". Alguns produtores de Valais, confiantes na qualidade dos vinhos da região, se uniram para elaborar uma Carta de regras de qualidade representadas pelo selo:
  • Utilizar somente vinhedos das localizações mais privilegiadas;
  • usar somente uvas de vinhas com pelo menos 15 anos;
  • limitar-se às variedades Arvine, Ermitage, Johannisberg (a.k.a. Sylvaner), Malvoisie (como os suíços chamam a Pinot Gris), Païen (a.k.a. Savagnin) e/ou Amigne;
  • usar somente uvas passificadas no pé;
  • proibido usar chaptalização, fortificação, osmose reversa ou qualquer processo que possa enriquecer o mosto artificialmente;
  • obter um mosto com concentração de açúcar de no mínimo 130° Oechslé [*]. (Este valor equivale a quase 320 g/L, o que dá um potencial alcoólico de 18,8% [*]);
  • maturar o vinho em barris ou barricas por no mínimo 12 meses;
  • não produzir o vinho em anos de condições climáticas desfavoráveis para a obtenção de grains nobles (ou seja, sem podridão nobre);
  • produzir vinhos em todos os anos favoráveis;
  • defender a essência da Carta, baseado na ética e na confiança.


De volta ao Tourbillon

O vinho tinha cor âmbar/alaranjada, intensa e brilhante. O aroma era intenso, remetendo a geléia de damasco, casca de tangerina, mel, flores brancas e coco (este último, certamente era influência do estágio em madeira). No fundo, dava para perceber um discreto toque químico, que possivelmente era o reflexo de uma pequena parcela de uvas botrytizadas. O sabor era igualmente intenso, bem doce e ao mesmo tempo com alta acidez, que o deixava bastante fresco. Tinha corpo médio, álcool bem discreto (13%), e final longo, reforçando as notas cítricas e de geléia.

Está muito acima da maioria de outros Colheitas Tardias, sendo mais justo equipará-lo aos Beerenauslese alemães. Mas o mais importante é que a combinação com o bolo foi perfeita. Da intensa doçura à vibrante acidez, passando pela afinidade dos aromas, até parecia que o bolo tinha sido feito pensando especificamente naquele vinho.

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