Do armazenamento do vinho

A maioria dos enófilos passa por isso: começa a comprar uma grande quantidade de vinhos, ou assina um clube e começa a acumular garrafas, e aí surge a dúvida... ou melhor, a certeza: preciso de uma adega climatizada. Será que precisa mesmo?

Seja em um curso para iniciantes, ou lendo na Internet, o enófilo vai encontrar que o vinho precisa ser armazenado em um local frio, de temperatura constante, não pode ser muito seco, nem muito úmido, e não pode ser a geladeira. Além disso, tem que permanecer deitado - ou suficientemente inclinado, para que a rolha fique em contato com o líquido, para não ressecar. Tudo isso para protegê-lo ao máximo. Para obter essas condições, a solução normalmente recai em uma adega climatizada.

Porém, essas condições ideais só são realmente importantes se você pretende guardar um vinho por anos. Elas não fazem tanta diferença assim se for para guardar poucos meses. Os vinhos não são assim tão frágeis!

Contra-exemplo

Um amigo deu de presente ao tio dele uma garrafa de um vinho branco Terrazas de los Andes Chardonnay Reserva 2006. De acordo com meu amigo, esse tio guardava os vinhos de pé, em uma prateleira alta da cozinha, onde batia sol no fim da tarde, todos os dias. O vinho ficou ali de pé uns dois anos. Acontece que o tio faleceu sem tomá-lo; e como a tia não bebia vinho, meu amigo o pegou de volta.

Ele o abriu em minha presença, na casa dele, mais por curiosidade do que esperança, achando que o vinho estivesse cozido. Mas o danado já tinha 10 anos, e ainda estava em condições! Tudo bem, um Chardonnay com estágio em madeira em uma garrafa de vidro escuro não era o vinho mais frágil do mundo; mas luz do sol direta, por dois anos? E mesmo permanecendo de pé, a rolha também não se ressecou.

Isso não quer dizer que podemos guardar os vinhos de qualquer jeito. O fato de aquela garrafa ter se salvado não significa que qualquer uma se manteria em boas condições. Mas demonstra que os vinhos não são tão frágeis, e por isso não precisamos de uma adega especial para guardar vinhos por alguns meses.

Minha experiência

O que eu descrevi no início do texto, aconteceu comigo: comecei a acumular uma quantidade maior de garrafas, e decidi comprar uma adega climatizada. Desde então, eu criei um 'sistema de controle' (uma planilha), onde registro os vinhos que comprei, quando os comprei, e quando os consumi. Assim, quando preciso escolher uma garrafa, em vez de abrir a adega, eu posso simplesmente ver o que tenho à disposição pela planilha.

Outro benefício que colhi desse sistema foi verificar meus hábitos de consumo. Nesses 3 anos e meio em que tenho registrado, 57% dos vinhos foram consumidos em menos de 60 dias após a compra. E apenas 7% deles foram consumidos após 1 ano. No que tenho atualmente em estoque, tenho 16 garrafas guardadas por mais de um ano, sendo apenas 3 delas há mais de 3 anos.

Como acontece com quase todo mundo que compra uma adega climatizada, rapidamente eu a enchi, e hoje, o que tenho em estoque já não cabe nela. Tenho algumas garrafas no armário de bebidas, e de vez em quando fica uma ou outra caixa num cantinho. Mas como pretendo consumir essas garrafas logo, não é grave. E portanto, não pretendo comprar uma adega maior por causa disso.

Como guardar vinhos fora da adega

É preciso ter bom senso: evitando luz direta e calor intenso sobre as garrafas, é possível guardar um tinto - ou mesmo certos brancos - por um ano ou pouco mais. Pode ser debaixo de uma escada, ou dentro de um armário. Basta certificar-se que o sol não incida diretamente sobre o armário, nem na parede contrária a este; que também não esteja ao lado de uma fonte de calor, como fogão, churrasqueira, ou mesmo geladeira.

Vinhos brancos mais leves, ou rosés, principalmente em garrafas transparentes, devem ser guardados por menos tempo. Preferencialmente menos de 6 meses. Não é de todo mal deixá-los na geladeira: não é equivalente a uma adega climatizada, mas por 2 ou 3 meses, não vai prejudicar o vinho. Melhor dentro da geladeira do que ao lado do fogão.

Vinhos de caráter oxidado, como Jerez Oloroso, Madeira, Porto Tawny, Marsala, vêm com tampa T, uma base de plástico, com um pequena cortiça por dentro. Nesse caso, o melhor é guardá-los de pé, no armário. O Oloroso e o Madeira podem ser guardados por muito tempo. Já o Porto e o Marsala, os melhores exemplares podem ser guardados por até alguns anos, mas os mais baratos, é melhor que sejam consumidos em até um ano.

Atenção: Porto LBV ou Vintage, que são tampados com rolhas de cortiça apropriadas, devem ser armazenados da mesma forma que um bom tinto, deitado. E caso tenha intenção de guardá-los por mais tempo, na adega.

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